20 anos de populismo

Primeiro rimos. Há cerca de 20 anos eram personagens como Manuel Vieira, o eterno candidato-vocalista dos Ena Pá 2000, uma banda que gostava de cantar letras pornográficas para chocar os reaccionários, que encarnavam um franja insignificante de pessoas antissistema. Se acha exagerado sequer falar nele, pensemos em Beppe Grillo, o comediante e político italiano.

Depois veio o Bloco de Esquerda preencher o espaço junto dos jovens que já dificilmente se reviam no Partido Comunista e que gostavam da ideia de um partido menos ditador na sua constituição e funcionamento. Corria o ano de 1999 quando concorreram pela primeira vez a umas eleições ? as europeias. Enquanto não decidíamos o que era esta nova força, chamávamos-lhe voto de protesto.

Com a crise financeira do início do século, vimos o voto de protesto chegar pela primeira vez ao poder na Grécia e assistimos aos "arruaceiros" do Syriza sentados à mesa com os líderes europeus que, eventualmente, por falta de alternativa, respeitávamos e tomávamos como única opção.

Em 2017, a América elegeu Donald Trump, estrela de reality show, magnata, mercenário capitalista, bronco, primário e chauvinista. Passaram sensivelmente 100 dias desde que foi eleito e o Washington Post registou cada declaração do Presidente e foi ver se era verdade. Trump mentiu 488 vezes, ou seja, uma média de 5 vezes por dia.  É obra! Ficou com os louros da criação de emprego e aumento do investimento deixados em legado por Obama. No dia 29 de Abril, quando foi assinalado o centésimo dia da sua presidência, somadas as suas intervenções públicas, mentiu 19 vezes. E esta é a verdade transversal a todos os líderes populistas que são eleitos unicamente pela habilidade de saberem falar a quem vota ou desacreditar o status quo.

Mas, se os EUA aguentam uma presidência embaraçosa ? a sua economia liberal segue indiferente ao mau juízo dos eleitores, as empresas continuam a contratar, os mercados a subir e os salários a aumentar nos últimos três meses ?, na Europa, o populismo terá consequências trágicas.

O protecionismo na Europa conduzirá ao empobrecimento acelerado da maioria dos países. Agravará o terrorismo, com líderes incapazes de diálogo. Se a causa da liberdade uniu a Europa contra a ditadura, a causa da degradação das expetativas de uma geração inteira está a dividi-la e a devolvê-la a discursos nacionalistas, embriões da falta dessa liberdade que, ainda há pouco, reconquistámos.

É preciso criar boas alternativas. Porque as alternativas fracas como a esquerda de Hollande ou a direita de Schäuble só têm contribuído para reforçar o espaço de quem há 20 anos nos rimos, há dez desvalorizámos e hoje, se tivermos juízo, tememos.

in Diário Economico

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