Caso BES: “Commissaire aux compte” diz que assumiu omissão da dívida para evitar queda do BES

Quem não se lembra da última entrevista de Ricardo Salgado antes da queda do BES, em que diz que dívida escondida da Espírito Santo Internacional (ESI) era responsabilidade do commissaire aux compte? Francisco Machado da Cruz, que Ricardo Salgado disse, em entrevista ao Jornal de Negócios, ser responsável pelas irregularidades detetadas nas Espírito Santo International, acabou por se demitir do cargo assumindo as responsabilidades pelos erros.

Francisco Machado da Cruz começou a depor esta quinta-feira enquanto testemunha no processo em que o Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão (TCRS), em Santarém, julga os pedidos de impugnação às contra-ordenações aplicadas pelo Banco de Portugal ao ex-presidente do BES, Ricardo Salgado (4 milhões de euros), e ao ex-administrador Amílcar Morais Pires (600 mil euros,) por, apesar de conhecerem a situação líquida negativa da ESI, terem permitido que fossem comercializados títulos de dívida desta instituição junto de clientes do banco.

Segundo a TVI 24 que cita a Lusa, o contabilista disse, esta quinta-feira, em tribunal que no final de 2013 assumiu a omissão de 1,3 mil milhões de euros de dívida no balanço da ESI como sendo um "erro" seu para evitar a queda do Grupo Espírito Santo (GES).

“Tive que fazê-lo. Se dissesse que havia omissão da dívida desde 2008 por decisão de Ricardo Salgado, o grupo caía”, declarou, segundo a Lusa.

Francisco Machado da Cruz foi quem supervisionou a contabilidade da ESI e das outras ?holdings' não financeiras do GES a partir de 2003.

Em dezembro de 2013, a empresa de auditoria KPMG confrontou Francisco Machado da Cruz com a omissão do passivo de 1,3 mil milhões de euros da ESI, depois de Ricardo Salgado ter enviado uma carta ao Banco de Portugal dizendo que havia um “erro” nas contas.

Recorde-se que foi feito uma correção às contas da ESI com a incorporação de ativos imobiliários em Angola.

Machado da Cruz contou como a auditora não acreditou que se pudesse tratar de um erro , pelo que agarrou no papel, escreveu "erro" e assinou, remetendo para Ricardo Salgado um pedido de explicação sobre os ativos imobiliários em Angola, que foram colocados para mostrar ao BdP que estavam na origem do passivo.

“Assumi a responsabilidade, mas não concordava. Achava que era altura de dizer a verdade", afirmou, segundo a Lusa, sublinhando que desconhecia a origem dos ativos, que "nasceram nas vésperas da auditoria da KPMG".

Questionado pela Procuradora do Ministério Público, o ?commissaire aux comptes' afirmou que logo que entrou para o grupo, em 1993, se apercebeu de que não era gerado ?cash flow' (fluxo de caixa) suficiente para cobrir o serviço da dívida das ?holdings'. Mas que no ano 2000 o grupo passou por "um período bom", com a venda de "bons investimentos" (como a participação no Carrefour, na Galp e na então Telecel), que permitiu ao GES com esse encaixe “aguentar-se bem”.

Com a crise financeira que se iniciou nos Estados Unidos e se expandiu à Europa, a ocultação do passivo começou a fazer-se a partir de 2008. A partir de 2008, “começaram a mexer no passivo”, disse, afirmando que a ESI estava já com um prejuízo “muito grande”.

Machado da Cruz também explicou que até aí, a ESI contabilizava as ações da ESFG (holding financeira, que estava cotada na bolsa) a partir de uma avaliação interna, atribuindo o “valor real” que era “muito superior ao cotado em bolsa”, dando como exemplo a indicação para atribuir um valor da ordem dos 21 euros numa altura em que as ações estavam a 5,25 euros.

“A ideia de usar a ESFG para colmatar o buraco na área não financeira das ?holdings' que estavam tecnicamente falidas”.

O ex-responsável pelas contas afirmou que a decisão de omitir dívida na plataforma informática, onde eram registados todos os movimentos contabilísticos da ESI foi de Ricardo Salgado: "não fico contente por o dizer, mas tenho que dizer a verdade", declarou Machado da Cruz segundo a Lusa.

Ricardo Salgado ter-lh-á sempre garantido que a situação se iria resolver, relatou, afirmando ter acreditado que havia uma estratégia.

Machado da Cruz disse ter ficado "perplexo" quando soube, já a posteriori, da venda do papel comercial da ESI junto de clientes do BES, e que advertiu para o “risco enorme” que representava.

O julgamento dos pedidos de impugnação apresentados por Ricardo Salgado e Amílcar Pires iniciou-se em 6 de março e tem audiências agendadas de segunda a quinta-feira até 28 de junho.

 

 

 

in Diário Economico

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