"Portugal é cada vez mais procurado para arbitragens"

A advogada e professora universitária Mariana França Gouveia iniciou uma nova etapa na sua carreira, ingressando na equipa de Arbitragem da PLMJ. Em entrevista conjunta, Mariana França Gouveia e José Miguel Júdice, sócio fundador da PLMJ, falam desta aposta e dos desafios e do potencial desta forma alternativa de resolução de litígios, em Portugal.

Gostava que falasse um pouco sobre a sua vida desde então. Foi uma opção? Quis voltar em força aos escritórios? A sua carreira estava mais ligada à Academia?

Mariana França Gouveia (MFG): Sempre tive uma ligação à advocacia, que retomei em 2006, após a interrupção na altura do Doutoramento e dos anos no Ministério da Justiça. Mas agora retomei, seguramente com mais intensidade. Nunca me passou pela cabeça ficar apenas pela academia, até porque a área que lecionei, tanto no Processo Civil, como mais tarde na Arbitragem, é muito difícil de ensinar, nomeadamente como os processos funcionam sem ter a prática. Portanto, sempre tive esta ideia e, agora, é claramente uma opção mais ligada à advocacia, sem sair da academia também. (…) O meu interesse é na área da Arbitragem e o José Miguel Júdice seria a única pessoa com quem poderia trabalhar intensamente nesta área, porque tem um conjunto de casos e uma equipa excecional que só trabalha Arbitragem. Só quero mesmo fazer Arbitragem, designadamente internacional, e este é o único escritório português com presença forte nesta área.

José Miguel Júdice (JMJ): Há anos que, meio a brincar, meio a sério, tentei diversas vezes falar com a Mariana, pois penso que ela é um "ativo" difícil de substituir atualmente em Portugal, porque foi, de facto, a académica que mais se dedicou, sistematicamente, à Arbitragem. É, portanto, uma grande figura, na minha opinião, do Direito Arbitral em Portugal. Pelas mãos dela têm passado, praticamente, todas as pessoas que estão a formar, fazer pós-graduações, mestrados na área, por isso está sempre atualizada, sendo essa uma grande vantagem da Academia. A nossa filosofia é de um crescimento orgânico, sempre pronto a ir buscar talento onde quer que ele esteja. E, de facto, termos a oportunidade de poder contar com a Mariana é fantástico. Não gostaríamos que deixasse de ser professora universitária, nem ela quer deixar. O que queremos é o carácter híbrido que decorre dessa dupla experiência como advogada e professora universitária.  É uma pessoa com uma experiência académica e prática, uma experiência que enriquece.

Quantos advogados tem a PLMJ nesta área?

JMJ: Na nossa equipa, restrita a casos de Arbitragem, temos 16 pessoas. Depois temos advogados em Angola, Moçambique, Porto e Algarve, que não fazem apenas Arbitragem. Continuamos abertos a captar talento e temos tido um crescimento orgânico. Estou muito satisfeito. Estive a fazer os cálculos dos últimos 10 meses do ano e eu próprio fiquei admirado. É preciso saber que esta equipa, com autonomia, começou em 2014. Fomos buscar muita gente que não tinha trabalho, não trazia clientes, vieram do estrangeiro, eram estagiários no começo e nós conseguimos, em três anos, aumentar cerca de 150% da faturação de Arbitragem. Não prometemos continuar a crescer a esse ritmo, mas a aposta parece que está a ser ganha, ou seja, a especialização em Arbitragem, o mercado começa gradualmente a acreditar nisso. Uma grande parte do nosso trabalho tem que ver com a parte internacional. Nós temos Arbitragens que se prendem com o facto de uma parte ser portuguesa, mas também representamos partes estrangeiras, sendo que temos arbitragens em que nenhuma das partes é portuguesa.

Há uma tendência para que Portugal seja procurado para resolver estes casos?

MFG: Penso que sim, por várias razões. Às vezes, por estarmos um bocadinho fora do mercado normal do que é a advocacia internacional, muito baseada no ?common law' [direito anglo-saxónico]. Somos vistos como neutros relativamente a certos conflitos internacionais. Assim como os suíços, por exemplo. E há uma pujança grande da comunidade arbitral, que tem vindo a crescer nos últimos 10 anos. Há uma visibilidade de quem faz arbitragem em Portugal que não existia antes.

Acha que ainda há alguns preconceitos quanto à Arbitragem no mercado português?

MFG: Sim, persiste uma certa ideia de que é uma Justiça em que não há uma igualdade plena. O que é completamente falso: está provado estatisticamente que nas decisões em arbitragens, em que uma das partes é o Estado e a outra o investidor, a maior parte das vezes é o Estado que ganha (pelo menos ao nível de arbitragem internacional) e não o oposto.

Há também a ideia de que a arbitragem continua a ser cara. Isso é mito ou realidade ?

MFG: Também é um mito, a partir de certo valor. Quando se diz que a arbitragem é cara, está a pensar-se em litígios de valor elevado. Mas a nível de custos judiciais, se compararmos com os custos do tribunal, a arbitragem compara muito bem, que é algo que a maior parte das pessoas não sabe ou não desconfia. Os custos do tribunal, hoje em dia, são caríssimos.

JMJ: Deixe-me fazer uma nota: se o Orçamento for aprovado nos termos que estão propostos, os juízes deixam de poder reduzir as custas se entenderem que o processo não teve especial complexidade. Enquanto o centro de arbitragem de Lisboa tem o dever de o fazer, isto é, o regulamento diz que pode baixar os custos até 40%. O Estado está a tentar obter impostos e os centros querem ter clientes. É uma lógica completamente diferente.

in Diário Economico

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