Web do sumiço

A Web Summit foi sem dúvida o mais importante evento de networking realizado em Portugal na área das startups tecnológicas e empreendedorismo. Contudo, importa relativizar enquadrando-o na realidade nacional, na medida em que o termo de comparação era extremamente baixo. Além disso, é fundamental consciencializar os mais entusiastas de que é um evento de networking, nada mais que isso.

Aliás, são os próprios organizadores que, em resposta a críticas da comunidade tecnológica, se afirmaram como gestores de conferências, atribuindo o seu sucesso ao recurso à análise algorítmica de tudo o que envolve uma conferência. Daí que, em vez de terem recrutado gestores, escolheram antes engenheiros e cientistas de dados, com vista a criar um ambiente físico e interpessoal mais eficaz.

Resumindo, a Web Summit não é mais do que qualquer outro evento, dos muitos que ocorrem na FIL todos os anos, só que este foi preparado através de uma análise científica muito mais detalhada. Contudo, nem a melhor organização do mundo consegue ultrapassar os obstáculos criados pela inexistência de um ambiente adequado para que o networking alcançado no evento possa resultar em negócios concretos no "mundo real", quanto mais uma mudança significativa na estrutura da economia nacional.

O sucesso de uma startup é muito fácil de explicar mas difícil de implementar por quem não entende a nova realidade económica do sector, porque o sucesso não deriva apenas de uma boa ideia. Ideias e projectos extraordinários nascem todos os dias. No entanto, sem a ligação ao financiamento e ao apoio da mesma através de ?know-how', nunca passará disso mesmo: uma boa ideia.

O paradigma actual do financiamento das startups, que geram o maior valor acrescentado, não é o financiador esperar o tempo necessário para que o produto pague o empréstimo. Hoje, é essencial que exista uma forma rápida e credível de o financiador ser amplamente recompensado mais cedo, através de uma colocação em bolsa da sua percentagem da empresa que criou o produto.

Aqui reside um dos principais problemas nacionais. Portugal não tem uma bolsa credível para efectuar as Ofertas Públicas de Venda. Outro obstáculo, para já intransponível, é a inexistência de um mercado de capitais robusto, onde o capital de risco é o principal financiador das startups, em contraponto com a recorrente ideia obsoleta de que a banca ou os fundos comunitários devem ser financiadores do sector.

Não é por isso surpreendente que os centros de startups e ?hubs' de enorme valor acrescentado com maior sucesso estejam em países com acesso rápido a uma bolsa credível e vibrante, e a um mercado de capitais respeitado e fomentado, como a Irlanda tem, à bolsa de Londres e a Wall Street.

Portanto, enquanto não forem criadas em Portugal as condições fundamentais ao nível fiscal, da literacia e do fomento decisivo do mercado de capitais, a Web Summit não passará de um sumiço de dinheiro para expositores e visitantes, extremamente lucrativo para os seus criadores e uma fonte de imagem positiva para o Governo em funções. Mas, no final do dia, nada de relevante irá mudar na realidade nacional, quando o evento, bem aproveitado pelos decisores políticos, podia perfeitamente ser a plataforma que Portugal precisa para, de uma vez por todas, se focar no maior valor acrescentado, que gera mais e melhores ordenados de forma sustentada.

O autor escreve segundo a antiga ortografia.

in Diário Economico

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