"Pay peanuts, get monkeys"

Tenho muita dificuldade em classificar a histeria colectiva em torno dos salários dos administradores da Caixa Geral de Depósitos. Da direita à esquerda, dos mais altos responsáveis aos taxistas (que finalmente se entretêm com outra coisa), todos criticam mais ou menos abertamente os vencimentos dos administradores da Caixa (se o vierem a ser, na realidade?) e o estatuto dos seus membros executivos. Parece-me que vivemos o que Portugal tem de mais pequenino e fazem-nos falta os Eças e os Pessoas para ridicularizar a inveja tornada desporto nacional, enquanto sintoma de um provincianismo maior. Mas talvez valha a pena centrar o debate de outra forma ou de outro ângulo, porventura menos político. Nesse sentido, a definição do que se pretende para o banco público será talvez o primeiro passo na direcção de um debate construtivo.

Hipótese 1: queremos um banco submisso aos interesses do Governo, um banco clientelar e permeável a negociatas políticas, um banco de encosto para as famílias partidárias do costume (que albergam tantos "boys and girls"), um banco-prateleira para garantir reformas aos fiéis de sempre? Se é isso que queremos, então não há dúvidas ? há que assegurar que temos uma instituição sem regras claras de gestão, um banco sem tino e sem rumo, ao qual basta aplicar o modelo a que obedece a generalidade das balofas empresas públicas, recheando-as de clientelas fiéis e, claro, pagando-lhes ?peanuts'. Depois lamentaremos a má gestão, a baixa produtividade e os resultados inexistentes, culminando numa nova necessidade de recapitalização, do tipo da que os governos Sócrates nos legaram.

Hipótese 2: queremos uma Caixa competitiva, dinâmica, inovadora, atenta à economia real, que se constitua como ?player' qualificado no apoio ao tecido económico e que actue no terreno segundo critérios de racionalidade financeira e económica, em lugar de se balizar de acordo com amizades ou antipatias pessoais? Se é isso, então também não sobeja muito espaço para hesitações: é necessário implementar um modelo de gestão transparente, rigoroso e absolutamente profissional, servido por gestores competentes e que, naturalmente, não se podem convencer com ?peanuts'.

Conheço bem António Domingues, partilhei conselhos de administração com ele e posso ser acusado de parcialidade. Mas quero afirmar que se trata de uma pessoa da maior competência, da maior idoneidade e de um rigor e profissionalismo inquestionáveis, pelo que estou certo que é a pessoa ideal para liderar a Caixa. Já não posso certamente ser acusado de parcialidade a favor deste Governo, mas é esta a hora para saudar a coragem de António Costa e Mário Centeno ? que, não querendo repetir os erros dramáticos do passado, optaram por um modelo para a CGD que vêm defendendo com convicção, apesar dos custos políticos que isso implica.

Estão certamente cientes do adágio que consta do título deste texto.

O autor escreve segundo a antiga ortografia.

in Diário Economico

Ver original


Parcerias

Arquivo