"Alone again, naturally"

Quarta-feira acordámos perante a certeza da incerteza com a vitória de Trump. Estas eleições nos EUA foram sem dúvida diferentes e um sinal disso é que os eleitores americanos iam votar não para escolher o melhor candidato, apenas o menos mau. Para o resto do mundo é certo que os EUA vão tornar-se mais protecionistas, portanto menos solidários e com prejuízo para o grau de união entre as nações ocidentais. O mundo já não é linear e está a tornar-se mais egoísta.

Com efeito, segundo a Global Trade Alert, coordenada pelo ?think-tank' britânico CEPR, entre novembro de 2008 ? início da crise, após a queda do Lehman Brothers em setembro ? e maio de 2016, os EUA foram o país que mais medidas protecionistas tomou (mais de 600), à frente da Rússia e da Índia, com pouco mais de 500. A Edmond de Rothschild estima que a eleição de Trump, além de medidas restritivas (incluindo aumentos de tarifas sobre as importações, que na China e no México irão para 45% e 35%, respetivamente) pode levar a uma desvalorização do dólar que reduzirá as exportações europeias para os EUA ? a valorização da moeda americana em 21% entre meados de 2014 e 2015 fez as importações americanas denominadas em euros aumentarem 22%.

Para Trump, os males da economia americana passam pela deslocalização da produção e pela penetração das importações, que impedem o crescimento do emprego, o que se revelou uma retórica interessante no contexto eleitoral, apesar dos riscos. A OMC chamou a atenção para esses riscos ao noticiar, em junho deste ano, a correlação entre esta retórica e a tomada de medidas protecionistas nas nações desenvolvidas, em particular no G20. Clinton é mais moderada, mas mesmo assim também se pronunciara contra o TPP, o Acordo de Parceria Transpacífico, o que não deixava boas expetativas para a finalização do TTIP, o Acordo de Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento. Tal como se pronunciara pela defesa do mercado americano para um largo conjunto de bens.

Infelizmente, a deriva protecionista não é exclusiva dos EUA, também na Europa se sente. Uma razão é semelhante: o desemprego é mais elevado na Europa que nos EUA, e o medo de perder o emprego é um ?driver' importante dos comportamentos. A Europa está numa tendência para o cada um por si, que urge estancar. Relembre-se o Brexit, que marca uma nova era na (des)construção europeia e volte-se ao aviso da OMC: a Alemanha é o sexto país em medidas protecionistas tomadas, mais de 350, pouco acima do Reino Unido. O próximo sinal virá de França, onde há eleições daqui a meses e cada vez mais candidatos se pronunciam pelo disciplinar das trocas ? um dos últimos, Arnaud Montebourg, no Le Monde de 27 de outubro, crítico do CETA e do poder crescente das multinacionais.

Uma coisa é segura como resultado das eleições americanas: os EUA não vão ser o campeão do comércio internacional nos próximos anos. Nem vão ser os campeões de outras coisas.

in Diário Economico

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